Prescrição de medicamento off-label: prescrição e responsabilidade civil

Prescrição de medicamento off-label: prescrição e responsabilidade civil

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Paula Moura Francesconi de Lemos Pereira
 
O complexo mundo dos medicamentos abrange análise ética, jurídica e técnico-científica. O ciclo de vida do medicamento passa pela fase de investigação e desenvolvimento, estudos pré-clínicos, clínicos, até obter o registro e autorização para comercialização, em seguida, ocorre o processo de fabricação, distribuição, prescrição, dispensa e utilização.
A prescrição de medicamento off-label, conhecido como uso não aprovado por agência reguladora em que o prescritor está estabelecido (no Brasil, a ANVISA), ou que não consta da bula, pode ser feita por médico, amparado em sua autonomia terapêutica, e costuma ocorrer para tratamento de doenças raras e órfãs, doenças para as quais ainda não foi descoberta a cura, e até mesmo, para pessoas potencialmente vulneráveis que dificilmente são submetidas às pesquisas como crianças, gestantes e idosos.
A temática além de todas as questões técnico-científicas que abarca e que envolve a saúde, a vida dos pacientes, acaba por ser objeto de judicialização com demandas propostas em face do Estado para fornecimento pelo SUS, em razão dos limites da lista do RENAME, bem como em face dos planos de saúdes, por não estar contemplado no rol da ANS, a despeito de restrições contratuais de cobertura.
Além disso, a negativa de cobertura acaba por implicar em pedidos de indenização por danos morais sofridos, o que não excluiria a aplicação do regime da responsabilidade civil quanto a eventual erro de prescrição, uso irracional do medicamento, danos decorrentes de eventos adversos, ou lesão à autodeterminação informativa. Os Tribunais inferiores, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal têm enfrentado a questão com a consolidação de súmulas, enunciados e teses, cabendo citar a título de exemplo, os temas nºs 06, 793, 1161 do STF, 106 e 990 do STJ, que abarcam o setor público e, o último, o privado.
A matéria também tem sido regulada pelo Poder Legislativo, a título de exemplo, a Lei nº 14.313/2022, que alterou a Lei nº 8.080/1990 – SUS (art. 19-T, parágrafo único, I e II), e a Lei nº 14.454/2022, que alterou a Lei nº 9.656/1998, Lei dos Planos de Saúde (art. 10, parágrafos 4º, 12, 13). Todavia, persistem as incertezas; os limites orçamentários; os impactos econômicos-financeiros; as dificuldades no acesso; a distribuição não igualitária e o substancial aumento das ações judiciais.
Os desafios são grandes e caberá aos operadores do direito um esforço hermenêutico para melhor aplicar o direito posto em prol da vida humana sem deixar de considerar que o serviço público de saúde se funda em pilares diversos da saúde suplementar.
 
*Paula Moura*
 
Doutora e Mestre em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Pós-graduada em Advocacia Pública pelo Centro de Estudos e Pesquisas no Ensino de Direito – CEPED-UERJ. Pós-graduada em Direito da Medicina pelo Centro de Direito Biomédico da Universidade de Coimbra/Portugal. Pós-graduanda em Direito da Farmácia e do Medicamento pela Universidade de Coimbra-PT. Professora do Instituto de Direito da PUC-Rio. Vice-Presidente da Comissão da OAB-RJ de Órfãos e Sucessões e membro da Comissão da OAB-RJ de Direito Civil. Coordenadora Adjunta de Direito Civil da ESA-RJ. Advogada
 
 
  • Greice Alves
  • GA Comunika

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